Imprimir

 

 

 

Práticas de ensino bilíngue: desafios e estratégias no ensino de português e inglês

Keila Pereira de Oliveira

Lucimar José Dias

Marcela Vieira da Cruz

Eliane Gonçalves Ramos Rodrigues

Jucilene Brito da Conceição Santos

 

DOI: 10.5281/zenodo.17496553

 

 

RESUMO

O ensino bilíngue tem se destacado no cenário educacional brasileiro como uma estratégia pedagógica promissora frente à globalização e à diversidade cultural. Este artigo objetiva discutir os principais desafios enfrentados por educadores no ensino de Português e Inglês em contextos bilíngues, bem como apresentar estratégias eficazes que favoreçam o desenvolvimento das competências linguísticas. A pesquisa se fundamenta na análise de aspectos como formação docente, desigualdades socioeconômicas e resistência cultural, articulando-os a práticas pedagógicas inovadoras que promovem a inclusão e a equidade no ensino de línguas. Estudos recentes (ALMEIDA; RIBEIRO, 2021, p. 45-62; MEDEIROS, 2019, p. 78-95; SOUZA; MARTINS, 2020, p. 102-118) sustentam a necessidade de investimentos em formação continuada, metodologias ativas e políticas públicas voltadas à valorização da interculturalidade como meio de consolidação de um modelo educacional bilíngue efetivo.

 

Palavras-chave: Ensino bilíngue. Formação docente. Políticas educacionais. Metodologias ativas. Interculturalidade.

 

 

ABSTRACT

Bilingual education has emerged in Brazilian schools as a pedagogical alternative aligned with globalization and cultural diversity. This paper aims to address the main challenges teachers face in teaching Portuguese and English in bilingual environments, as well as to present effective strategies to develop linguistic competence. The research focuses on teacher training, socioeconomic disparities, and cultural resistance, linking them to innovative pedagogical practices that foster inclusion and equity in language teaching. Recent studies (ALMEIDA; RIBEIRO, 2021, p. 45-62; MEDEIROS, 2019, p. 78-95; SOUZA; MARTINS, 2020, p. 102-118) support the importance of investing in continuing education, active methodologies, and public policies that enhance intercultural appreciation to consolidate an effective bilingual education model.

 

Keywords: Bilingual education. Teacher training. Educational policies. Active methodologies. Interculturality.

 

 

1 -INTRODUÇÃO

 

O ensino bilíngue tem ganhado destaque no cenário educacional brasileiro, especialmente frente à crescente globalização e às novas demandas sociais, culturais e econômicas. A intensificação dos fluxos migratórios, a expansão das tecnologias da informação e a inserção do Brasil em contextos multilíngues tornam cada vez mais necessário repensar as práticas pedagógicas relacionadas à aprendizagem de línguas. Nesse contexto, compreender os desafios e estratégias no ensino de línguas, sobretudo do português e do inglês, torna-se fundamental para uma formação mais inclusiva e eficaz. O bilinguismo, nesse sentido, vai além do simples ensino de dois idiomas, envolvendo aspectos cognitivos, sociais, culturais e metodológicos que impactam diretamente a qualidade da aprendizagem e a construção identitária dos sujeitos.

O bilinguismo educacional deve ser entendido como um processo complexo e multifacetado que implica o uso funcional de duas línguas no ambiente escolar, promovendo o desenvolvimento equilibrado das competências linguísticas e cognitivas dos estudantes. Trata-se de uma proposta que rompe com a lógica tradicional de ensino de línguas estrangeiras como disciplinas isoladas e propõe a integração das línguas como veículos para o acesso ao conhecimento. Para além da competência comunicativa, a educação bilíngue proporciona uma maior flexibilidade cognitiva, melhora a atenção seletiva, estimula o raciocínio abstrato e amplia as possibilidades de inserção dos alunos em um mundo cada vez mais interconectado.

Entretanto, a implementação da educação bilíngue no Brasil tem percorrido caminhos desiguais, sobretudo devido à falta de políticas públicas estruturadas, à ausência de diretrizes nacionais consolidadas e à carência de formação específica para os professores que atuam nesse campo. A maioria dos programas bilíngues existentes concentra-se em escolas privadas, voltadas para uma elite econômica, o que acentua ainda mais as desigualdades educacionais no país. Além disso, há uma carência de materiais didáticos adaptados à realidade sociocultural brasileira e uma resistência por parte de alguns setores da sociedade, que veem o bilinguismo com desconfiança ou o associam, erroneamente, à perda da identidade nacional.

Como aponta Garcia (2009, p. 144), “o bilinguismo educacional não se limita à exposição linguística, mas envolve práticas pedagógicas que reconhecem e valorizam a identidade linguística do aluno”. Essa afirmação reforça a ideia de que o ensino bilíngue deve estar ancorado em princípios de valorização da diversidade linguística e cultural, promovendo uma educação crítica e inclusiva. Nesse sentido, torna-se urgente refletir sobre como essas práticas vêm sendo implementadas nas instituições de ensino brasileiras e quais estratégias podem ser adotadas para superar os inúmeros desafios impostos por esse modelo educacional.

Diante dessa realidade, este artigo tem como objetivo discutir as práticas de ensino bilíngue no Brasil, com foco nos desafios enfrentados e nas estratégias que podem ser aplicadas para promover um ensino mais eficaz do português e do inglês. A proposta é analisar de que forma a formação docente, a estrutura institucional e as abordagens metodológicas podem contribuir para a consolidação de uma educação bilíngue de qualidade, voltada para a equidade e para o respeito às identidades culturais e linguísticas dos alunos.

A pesquisa é de caráter qualitativo e bibliográfico, fundamentando-se em estudos e contribuições teóricas de autores como Bialystok (2001), Hamers e Blanc (2000) e Garcia (2009), entre outros, cujas investigações oferecem importantes subsídios para a compreensão do bilinguismo no contexto educacional. Ao recorrer à literatura especializada, busca-se construir um referencial sólido que possibilite compreender as nuances da educação bilíngue, seus princípios, seus benefícios e suas limitações.

Assim, espera-se contribuir para a construção de um olhar mais crítico e sensível à prática bilíngue, compreendendo não apenas os obstáculos, mas também as possibilidades transformadoras desse modelo educacional. A análise será dividida em quatro partes: o primeiro capítulo abordará os fundamentos teóricos do ensino bilíngue; o segundo discutirá os principais desafios encontrados nas práticas pedagógicas; o terceiro apresentará estratégias eficazes para o ensino das línguas portuguesa e inglesa; e o quarto refletirá sobre a formação docente e a prática em sala de aula. Por fim, serão tecidas as considerações finais sobre a relevância dessa modalidade educacional no atual contexto brasileiro.

 

 

2 -FUNDAMENTOS TEÓRICOS DO ENSINO BILÍNGUE

 

A compreensão adequada sobre o ensino bilíngue exige uma reflexão aprofundada acerca de seus fundamentos teóricos e das diferentes abordagens conceituais que sustentam essa prática pedagógica. Ao longo da história da educação, o bilinguismo tem sido objeto de interesse de estudiosos de diversas áreas, como a linguística, a psicologia, a pedagogia e as ciências sociais, o que contribui para uma visão multifacetada do fenômeno. De acordo com Hamers e Blanc (2000, p. 26), bilinguismo refere-se à capacidade que um indivíduo tem de utilizar dois idiomas de maneira funcional em distintos contextos comunicativos. Tal definição reconhece que a competência linguística envolve não apenas a codificação e decodificação de estruturas linguísticas, mas também o uso social e comunicativo da língua, evidenciando a complexidade desse fenômeno no cotidiano dos falantes.

É imprescindível compreender que, no contexto escolar, o bilinguismo adquire contornos pedagógicos que demandam abordagens específicas. A educação bilíngue não se resume ao ensino de uma segunda língua como disciplina isolada, mas sim à utilização de dois idiomas como meios de instrução para o desenvolvimento de competências acadêmicas e cognitivas. Para Bialystok (2001), esse tipo de educação proporciona benefícios significativos, como maior flexibilidade cognitiva, desenvolvimento de estratégias de resolução de problemas, habilidade para alternar entre códigos linguísticos e maior consciência metalinguística. Esses ganhos refletem diretamente na qualidade do aprendizado e no desempenho dos alunos em diferentes áreas do conhecimento.

A distinção entre os tipos de bilinguismo também se mostra fundamental para uma análise crítica da educação bilíngue. Cummins (2000) distingue dois modelos principais: o bilinguismo aditivo e o subtrativo. O primeiro ocorre quando o indivíduo aprende uma segunda língua sem que haja prejuízo à língua materna, promovendo a valorização e o enriquecimento das duas culturas. Já o bilinguismo subtrativo é caracterizado pelo enfraquecimento ou abandono da língua materna, geralmente por pressões sociais e institucionais, o que pode resultar em danos à identidade cultural do falante. Essa diferenciação é particularmente importante em contextos de minorização linguística, em que grupos sociais veem sua língua e cultura marginalizadas em favor de uma língua dominante.

O papel da escola, nesse sentido, é central. Garcia (2009) destaca que a instituição de ensino deve ser um espaço de valorização e reconhecimento das diferentes línguas e culturas presentes no ambiente escolar. Isso implica a construção de currículos plurais e sensíveis à diversidade, bem como a capacitação de professores que compreendam as especificidades do ensino em contextos multilíngues. A escola que adota uma abordagem bilíngue de forma comprometida deve promover um ambiente acolhedor, inclusivo e aberto à diversidade cultural e linguística, atuando como agente ativo na formação de cidadãos bilíngues conscientes de sua identidade e das múltiplas formas de expressão.

A consolidação de uma educação bilíngue de qualidade exige, ainda, a superação de paradigmas tradicionais que concebem a língua como instrumento neutro e homogêneo. A linguagem, como enfatizam os estudos sociolinguísticos, é profundamente marcada por fatores sociais, históricos e ideológicos. Por isso, a prática bilíngue deve considerar as relações de poder entre línguas, os processos de estigmatização de determinados dialetos e o lugar ocupado pelas línguas maternas nos sistemas educacionais. Essa perspectiva crítica amplia a compreensão do ensino bilíngue e possibilita práticas mais equitativas e contextualizadas.

 

 

3- DESAFIOS NO ENSINO BILÍNGUE DE PORTUGUÊS E INGLÊS

 

A implementação do ensino bilíngue no Brasil enfrenta uma série de entraves que dificultam sua efetivação de forma equitativa e eficiente. Um dos principais desafios reside na ausência de políticas públicas consistentes que apoiem a formação específica de professores e garantam a elaboração de propostas curriculares alinhadas com os princípios do bilinguismo. Costa (2017, p. 82) aponta que muitos programas ditos bilíngues são utilizados como estratégia de marketing por escolas privadas, sem uma real preocupação com a metodologia e os objetivos pedagógicos que a educação bilíngue requer. Essa superficialidade compromete o desenvolvimento pleno das competências esperadas dos alunos e promove uma banalização do termo “bilíngue” no discurso educacional.

Além disso, o acesso à educação bilíngue de qualidade ainda está restrito a uma parcela privilegiada da população. A maioria das escolas bilíngues encontra-se no setor privado, voltada para famílias de alta renda, o que evidencia uma desigualdade estrutural no sistema educacional brasileiro. Essa realidade entra em choque com o princípio constitucional da equidade e revela o caráter elitista que o ensino bilíngue pode assumir quando não é tratado como uma política pública universal, evidenciando uma desigualdade estrutural no sistema educacional brasileiro.  A exclusão de estudantes da rede pública do acesso a programas bilíngues perpetua a divisão entre uma elite multilíngue e uma maioria monolíngue, limitando as oportunidades de inserção desses indivíduos no mercado de trabalho globalizado. A situação torna-se ainda mais preocupante quando se observa que, em muitas regiões do país, sequer há políticas de valorização de línguas indígenas ou regionais, o que amplia a exclusão linguística e cultural

Outro aspecto que merece destaque é a resistência cultural à introdução da segunda língua na escola. Muitos pais, professores e gestores demonstram preocupação com a possibilidade de que o aprendizado de uma nova língua prejudique o domínio da língua portuguesa, considerada essencial para o sucesso acadêmico e profissional. Contudo, Cummins (2000, p. 33) esclarece que o domínio de uma segunda língua só é verdadeiramente alcançado quando a língua materna é bem desenvolvida e valorizada. Assim, a ideia de que o bilinguismo compromete o português carece de embasamento teórico e deve ser superada por meio de campanhas de conscientização e formação docente qualificada.

Contudo, Cummins (2000, p. 33) esclarece que o domínio de uma segunda língua só é verdadeiramente alcançado quando a língua materna é bem desenvolvida e valorizada. Assim, a ideia de que o bilinguismo compromete o português carece de embasamento teórico e deve ser superada por meio de campanhas de conscientização e formação docente qualificada. Essa resistência, muitas vezes, está ligada a uma visão conservadora da educação, que enxerga a língua nacional como única via de acesso ao conhecimento, ignorando o potencial enriquecedor do contato com outros idiomas e culturas.

A falta de materiais didáticos contextualizados também se configura como um dos obstáculos mais frequentes no cotidiano das escolas bilíngues. Em muitos casos, os recursos são produzidos em outros países, com referências culturais, linguísticas e pedagógicas que não dialogam com a realidade brasileira. Rocha (2018, p. 119) salienta que o ensino bilíngue precisa estar em sintonia com a cultura local, respeitando as identidades dos sujeitos envolvidos e promovendo uma educação significativa. Dessa forma, torna-se urgente a produção de materiais próprios, que contemplem a diversidade sociocultural do país e sejam acessíveis a todas as redes de ensino.

Em muitos casos, os recursos são produzidos em outros países, com referências culturais, linguísticas e pedagógicas que não dialogam com a realidade brasileira. Rocha (2018, p. 119) salienta que o ensino bilíngue precisa estar em sintonia com a cultura local, respeitando as identidades dos sujeitos envolvidos e promovendo uma educação significativa. Dessa forma, torna-se urgente a produção de materiais próprios, que contemplem a diversidade sociocultural do país e sejam acessíveis a todas as redes de ensino. Isso também implica a valorização de autores e especialistas brasileiros na área do bilinguismo, cuja produção ainda é pouco explorada e divulgada nas instituições escolares.

Cabe ainda destacar que a ausência de avaliação padronizada para programas bilíngues no Brasil contribui para a multiplicidade de práticas e a falta de controle de qualidade. Sem instrumentos de acompanhamento e indicadores claros de aprendizagem, torna-se difícil mensurar os impactos reais do bilinguismo na trajetória escolar dos estudantes. Isso fragiliza as políticas educacionais e compromete o direito à aprendizagem de qualidade, sendo necessária a criação de parâmetros nacionais de referência para o ensino.

A implementação do ensino bilíngue no Brasil enfrenta uma série de entraves que dificultam sua efetivação de forma equitativa e eficiente. Um dos principais desafios reside na ausência de políticas públicas consistentes que apoiem a formação específica de professores e garantam a elaboração de propostas curriculares alinhadas com os princípios do bilinguismo. Costa (2017, p. 82) aponta que muitos programas ditos bilíngues são utilizados como estratégia de marketing por escolas privadas, sem uma real preocupação com a metodologia e os objetivos pedagógicos que a educação bilíngue requer. Essa superficialidade compromete o desenvolvimento pleno das competências esperadas dos alunos e promove uma banalização do termo “bilíngue” no discurso educacional.

Cabe ainda destacar que a ausência de avaliação padronizada para programas bilíngues no Brasil contribui para a multiplicidade de práticas e a falta de controle de qualidade. Sem instrumentos de acompanhamento e indicadores claros de aprendizagem, torna-se difícil mensurar os impactos reais do bilinguismo na trajetória escolar dos estudantes. Isso fragiliza as políticas educacionais e compromete o direito à aprendizagem de qualidade, sendo necessária a criação de parâmetros nacionais de referência para o ensino bilíngue. A inexistência de uma legislação específica que defina diretrizes para esse modelo educativo permite interpretações diversas e, muitas vezes, distorcidas, prejudicando a consistência e a continuidade das ações pedagógicas que fragiliza as políticas educacionais e compromete o direito à aprendizagem de qualidade. À inexistência de uma legislação específica que defina diretrizes para esse modelo educativo permite interpretações diversas e, muitas vezes, distorcidas, prejudicando a consistência e a continuidade das ações pedagógicas.

Ademais, é importante observar que a escassez de pesquisas de campo aplicadas à realidade brasileira limita a capacidade de planeamento adequado por parte dos gestores escolares e dos formuladores de políticas públicas. A maior parte das referências utilizadas nas escolas provém de contextos internacionais, cuja realidade social, cultural e linguística difere significativamente da brasileira. Assim, um dos grandes desafios atuais é fomentar a produção científica nacional sobre bilinguismo, que possa orientar práticas educativas fundamentadas e eficazes em nossas escolas. É fundamental que a prática do ensino bilíngue seja construída com base em evidências locais e respeitando as especificidades de cada comunidade escolar, contribuindo, assim, para a democratização do acesso à educação de qualidade.

 

 

4 ESTRATÉGIAS PARA UM ENSINO BILÍNGUE EFICAZ

 

Apesar dos inúmeros desafios enfrentados, existem estratégias que podem ser adotadas para fortalecer o ensino bilíngue no país, com vistas à sua consolidação como uma política educacional efetiva, democrática e de qualidade. Entre as medidas prioritárias está a formação continuada dos professores, que deve abranger não apenas a fluência em uma segunda língua, mas também os conhecimentos teóricos e práticos sobre aquisição de linguagem, metodologias bilíngues e educação intercultural. Coyle, Hood e Marsh (2010, p. 48) destacam que a integração entre conteúdo e linguagem é fundamental para o sucesso das práticas bilíngues, reforçando a necessidade de uma abordagem interdisciplinar.

A metodologia CLIL (Content and Language Integrated Learning), que propõe o ensino de conteúdos escolares por meio de uma segunda língua, tem se mostrado promissora em diversos contextos internacionais. Pesquisas de Mehisto, Marsh e Frigols (2008) revelam que alunos inseridos nesse tipo de abordagem apresentam melhor desempenho acadêmico, maior engajamento e desenvolvimento mais equilibrado das competências linguísticas e cognitivas. No Brasil, a adoção do CLIL pode representar uma inovação metodológica significativa, desde que acompanhada de formação adequada e adaptação curricular.

A produção e adaptação de materiais didáticos culturalmente pertinentes também constitui uma estratégia indispensável para o êxito da educação bilíngue. A contextualização dos conteúdos permite que os alunos se vejam representados nos materiais e estabeleçam conexões significativas com o que aprendem. Como afirma Kramsch (1998, p. 29), a linguagem é expressão de pertencimento cultural, e seu ensino deve refletir as múltiplas identidades presentes na sala de aula. Portanto, materiais que valorizem a diversidade cultural, linguística e regional dos alunos contribuem para uma aprendizagem mais significativa e crítica.

As tecnologias educacionais emergem como ferramentas poderosas para apoiar o ensino bilíngue, especialmente em um contexto de ampliação do acesso à internet e dispositivos digitais. Plataformas interativas, recursos audiovisuais, aplicativos de idiomas e ambientes virtuais colaborativos favorecem a imersão linguística, o contato com diferentes sotaques e variedades da língua e o desenvolvimento da autonomia dos estudantes. No entanto, conforme alerta Paiva (2020, p. 74), a inserção tecnológica deve ser orientada por objetivos pedagógicos claros, evitando que a tecnologia se torne um fim em si mesma e reproduza passivamente conteúdos descontextualizados.

Outro ponto relevante é o envolvimento da comunidade escolar e das famílias no processo de ensino bilíngue. A participação ativa dos pais, o esclarecimento sobre os objetivos da proposta bilíngue e o acompanhamento das atividades contribuem para a criação de uma rede de apoio que fortalece o processo educativo. A construção de um projeto pedagógico bilíngue eficaz requer, assim, o compromisso coletivo de todos os envolvidos no ambiente escolar.

 

 

5 A PRÁTICA EM SALA DE AULA E A FORMAÇÃO DOCENTE

 

A sala de aula é o espaço onde se concretizam, de forma prática, as concepções teóricas e metodológicas sobre o ensino bilíngue. É nesse ambiente que se evidencia a complexidade de lidar com múltiplas línguas, culturas e níveis de proficiência linguística entre os estudantes. A atuação do professor, nesse cenário, é determinante para o sucesso das estratégias bilíngues, sendo necessário que ele vá muito além do domínio linguístico. O educador deve ser capaz de integrar saberes teóricos sobre a aquisição de linguagem, princípios da pedagogia bilíngue e habilidades interculturais, além de possuir sensibilidade pedagógica para lidar com a diversidade e a subjetividade dos alunos.

De acordo com Brown (2007, p. 67), o professor de línguas deve ser concebido como um mediador cultural, alguém que transita entre diferentes universos simbólicos e promove o diálogo entre línguas, culturas e formas de pensar. Isso implica não apenas em traduzir conteúdos, mas em construir significados com os alunos, estimulando a reflexão crítica sobre as línguas que utilizam e os contextos em que elas circulam. Tal postura exige uma formação sólida, que vá além do tecnicismo e do ensino tradicional de gramática normativa, considerando também as dimensões éticas, políticas e afetivas do processo educativo.

No entanto, a formação inicial dos docentes brasileiros ainda apresenta importantes lacunas no que tange à preparação para o ensino bilíngue. Muitos cursos de licenciatura em Letras ou Pedagogia não incluem disciplinas que abordem de maneira aprofundada o bilinguismo, suas modalidades e os desafios de sua implementação em contextos escolares reais. Como consequência, professores são lançados à prática sem o preparo necessário, o que os leva a improvisar estratégias pedagógicas, muitas vezes reproduzindo modelos inadequados ou ineficazes. Esse cenário evidencia a urgência da reformulação dos currículos de formação docente, que devem incorporar, de forma transversal, temas relacionados ao multilinguismo, à interculturalidade e às metodologias ativas de ensino de línguas.

A formação continuada, nesse contexto, assume papel crucial na qualificação dos profissionais da educação bilíngue. Por meio de cursos de extensão, especializações, oficinas pedagógicas e grupos de estudo, os professores têm a oportunidade de aprimorar suas práticas, trocar experiências e atualizar seus conhecimentos frente às mudanças sociais e tecnológicas que afetam o ensino de línguas. Além disso, é fundamental que essa formação esteja articulada com as demandas reais da escola e dos alunos, e não apenas com ideais abstratos que muitas vezes se distanciam da realidade do chão da escola. O investimento em programas institucionais de desenvolvimento profissional deve ser uma prioridade das redes de ensino comprometidas com a qualidade e a equidade do ensino bilíngue.

No cotidiano da sala de aula bilíngue, é necessário que o professor desenvolva habilidades de planejamento e adaptação curricular, uma vez que os alunos apresentam níveis diversos de proficiência nas línguas envolvidas. A diferenciação pedagógica, como salientam Tomlinson e Moon (2013), é uma prática indispensável, pois reconhece a individualidade dos estudantes e busca atender às suas necessidades específicas por meio de estratégias variadas, como o uso de materiais diversificados, agrupamentos flexíveis e atividades multimodais. Assim, o ensino se torna mais inclusivo e eficaz, favorecendo o engajamento de todos os alunos, independentemente de seu nível inicial de domínio da língua adicional.

Além disso, o trabalho colaborativo entre os professores de língua portuguesa e de língua inglesa pode enriquecer significativamente o processo pedagógico em contextos bilíngues. Essa colaboração permite uma abordagem interdisciplinar, evita a fragmentação do currículo e promove uma visão mais ampla e integrada do conhecimento. Quando os docentes atuam de forma articulada, é possível explorar temas transversais, desenvolver projetos interdisciplinares e estimular o uso das duas línguas em situações autênticas e significativas. Tal cooperação também contribui para o fortalecimento da equipe pedagógica, promovendo um ambiente de trabalho mais colaborativo, reflexivo e aberto à inovação.

É necessário destacar que o sucesso do ensino bilíngue não depende apenas do esforço individual dos professores, mas também de um conjunto de condições estruturais e institucionais que viabilizem a prática docente. Isso inclui, entre outros fatores, a existência de um projeto político-pedagógico claro e coerente com os princípios bilíngues, o acesso a materiais didáticos de qualidade, a disponibilidade de recursos tecnológicos adequados e o apoio da equipe gestora. Sem essas condições mínimas, a prática bilíngue corre o risco de se tornar superficial ou até mesmo inviável, gerando frustração tanto para professores quanto para alunos.

O papel da gestão escolar, nesse sentido, é fundamental para assegurar a implementação eficaz de programas bilíngues. Cabe aos gestores promover a formação de suas equipes, garantir condições adequadas de trabalho e fomentar uma cultura institucional que valorize a diversidade linguística e cultural. A gestão democrática e participativa é essencial para o fortalecimento do ensino bilíngue, pois permite a construção coletiva de soluções para os desafios que se apresentam, bem como o compartilhamento de responsabilidades entre todos os membros da comunidade escolar.

Outro aspecto que merece atenção é o acompanhamento e avaliação contínua das práticas bilíngues. Avaliar não apenas o desempenho dos alunos, mas também a eficácia das estratégias adotadas e a coerência entre os objetivos e os resultados obtidos, é um passo necessário para o aprimoramento das ações pedagógicas. Essa avaliação deve ser formativa, processual e integrada ao planejamento, permitindo ajustes contínuos e promovendo uma cultura de reflexão permanente sobre a prática docente. Ferramentas como portfólios, autoavaliações, observações de aula e grupos de discussão podem ser valiosas nesse processo.

Em síntese, a formação docente para o ensino bilíngue deve ser pensada como um processo contínuo, crítico e contextualizado, que reconhece a complexidade dessa prática educativa e busca oferecer aos professores os subsídios teóricos, metodológicos e materiais necessários para seu pleno desenvolvimento. Para que isso se concretize, é imprescindível que as instituições formadoras, as redes de ensino e os próprios professores assumam uma postura de compromisso ético e político com a construção de uma educação bilíngue de qualidade, inclusiva e transformadora.

 

 

6 CONCLUSÃO

 

Este trabalho teve como proposta discutir os desafios e as estratégias do ensino bilíngue em contextos brasileiros, com ênfase nas línguas portuguesa e inglesa. Através de uma abordagem qualitativa e bibliográfica, foi possível compreender como a formação docente, as desigualdades sociais, a ausência de políticas públicas e a resistência cultural se constituem como barreiras relevantes para a consolidação efetiva do bilinguismo nas instituições escolares do país. A pesquisa permitiu identificar que tais entraves não são pontuais, mas estruturais, exigindo ações coordenadas entre governos, escolas, professores e comunidades para que o ensino bilíngue deixe de ser uma proposta isolada e passe a ser uma política educacional inclusiva e eficaz.

As análises realizadas ao longo do trabalho evidenciaram que, embora existam dificuldades consideráveis, há também caminhos viáveis para a superação desses obstáculos. Estratégias como a formação continuada de professores, a adoção de metodologias ativas, a produção de materiais didáticos contextualizados e o envolvimento da comunidade escolar demonstraram-se eficazes na promoção de uma prática bilíngue mais sensível às realidades culturais e linguísticas dos alunos. A valorização da interculturalidade e a integração entre conteúdo e linguagem revelam-se elementos centrais para que o ensino bilíngue cumpra seu papel social e pedagógico, indo além do ensino técnico de duas línguas e atuando como ferramenta de transformação e inclusão.

Com base nos objetivos propostos, pode-se afirmar que o estudo atingiu plenamente sua finalidade, ao promover uma reflexão crítica sobre a realidade do ensino bilíngue no Brasil e indicar soluções concretas e aplicáveis à prática educativa. As contribuições teóricas discutidas confirmam que, quando desenvolvido de forma planejada, crítica e inclusiva, o ensino bilíngue pode ampliar as oportunidades educacionais dos alunos, fortalecer suas identidades e capacitá-los para atuar em um mundo plural e globalizado. Ao final da análise, fica evidente que o sucesso do bilinguismo depende de um esforço coletivo, sustentado por compromisso institucional, políticas públicas coerentes e uma postura pedagógica que respeite e valorize a diversidade em todas as suas formas.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

ALMEIDA, José; RIBEIRO, Maria. Investimentos em formação continuada e metodologias ativas no ensino bilíngue. Revista de Educação Bilíngue, São Paulo, v. 3, n. 1, p. 45–62, 2021.

 

BIALYSTOK, Ellen. Bilingualism in Development: Language, Literacy, and Cognition. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.

 

BROWN, H. Douglas. Teaching by Principles: An Interactive Approach to Language Pedagogy. 3. ed. White Plains, NY: Pearson Education, 2007.

 

COYLE, Do; HOOD, Philip; MARSH, David. CLIL: Content and Language Integrated Learning. Cambridge: Cambridge University Press, 2010.

 

COSTA, Ana Paula. A banalização do termo “bilíngue” em escolas privadas. Educação em Debate, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 82–90, 2017.

 

CUMMINS, Jim. Language, Power and Pedagogy: Bilingual Children in the Crossfire. Clevedon: Multilingual Matters, 2000.

 

GARCIA, Ofelia. Bilingual Education in the 21st Century: A Global Perspective. Malden, MA: Wiley-Blackwell, 2009.

 

HAMERS, Josiane F.; BLANC, Michel H. A. Bilinguality and Bilingualism. 2. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2000.

 

KRAMSCH, Claire. The cultural component of language teaching. Foreign Language Annals, Alexandria, v. 31, n. 4, p. 29–43, 1998.

 

MEDEIROS, Carla. Políticas públicas e interculturalidade no ensino de línguas. Língua & Educação, Recife, v. 12, n. 3, p. 78–95, 2019.

 

MEHISTO, Peeter; MARSH, David; FRIGOLS, Maria Jesus. Uncovering CLIL: Content and Language Integrated Learning in Bilingual and Multilingual Education. Oxford: Macmillan, 2008.

 

PAIVA, Lívia. O papel das tecnologias no ensino bilíngue. Tecnologia & Educação, Belo Horizonte, v. 8, n. 1, p. 74–85, 2020.

 

ROCHA, Fernanda. Materiais didáticos e cultura local no bilinguismo. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, São Paulo, v. 18, n. 2, p. 119–130, 2018.

 

SOUZA, Renato; MARTINS, Helena. Interculturalidade e formação docente em contextos bilíngues. Educação em Foco, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 102–118, 2020.

 

Acessos: 78