Intervenção precoce de criança com transtorno do espectro autista na Educação infantil
Joana Célia Silva Ferreira[1]
Sandra Karina Mendes do Vale[2]
RESUMO
Este artigo tem como objetivo mapear os primeiros estudos e os locais mais pesquisados nos últimos cinco anos sobre a Intervenção Precoce de crianças com transtorno do espectro autista( TEA) na Educação Infantil, a partir da análise dos periódicos e revistas da biblioteca eletrônica SCIELO (Scientific Eletronic Library Online), as dissertações na BDTD (Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações),e nos trabalhos apresentados nas Reuniões Anuais Nacionais da ANPED (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação), especialmente no Grupo de Trabalho (GT 15) e publicados no período de 2018 à 2023, que relatam sobre a intervenção precoce de crianças com TEA na educação infantil. Os dados encontrados proporcionam o acesso ao cenário dos últimos anos sobre as produções acadêmicas, assim como a visão dos diferentes autores sobre o tema em questão. Diante da análise, os resultados mostram que embora essa abordagem tenha ganhado mais visibilidade e interesse por se tratar de um tema que requer mais aprofundamento nos estudos, ainda necessita de conhecimento do poder público e consequentemente de políticas públicas educacionais que proporcione um acesso e permanência desses sujeitos a um ambiente escolar organizado e adequado às especificidades individuais e coletivas.
Palavras-chave: intervenção precoce. Autismo. Educação Infantil.
INTRODUÇÃO
O termo Intervenção Precoce já foi usado como estimulação infantil, estimulação precoce, intervenção infantil, no qual se descrevem práticas para promover a aprendizagem e o desenvolvimento de crianças com deficiência ou em condições favoráveis a risco de atrasos no desenvolvimento. Ao longo do século XX, essa área de conhecimento reuniu um grande conjunto de pesquisas que demonstraram que a plasticidade cerebral e os tipos de experiências podem afetar positivamente o comportamento, aprendizagem e desenvolvimento da criança. As práticas de Intervenção Precoce na Infância vêm avançando de diferentes formas em diversos países, com práticas heterogêneas em relação aos objetivos, postura dos profissionais e participação das famílias no processo, devido às particularidades de suas legislações e à aplicação de políticas acerca das necessidades de crianças e famílias (Guerra et al, 2020).
Com esse intuito, fez-se necessário mapear na literatura brasileira a produção do conhecimento na Intervenção Precoce de crianças com transtorno do espectro autista (TEA) na Educação Infantil. Essa ação foi intermediada a partir da análise de periódicos e revistas que integram a SciELO (Scientific Electronic Library Online) , também conhecida pelo nome em português Biblioteca Eletrônica Científica Online, Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) e Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Nesse viés, pensou-se em desenvolver um artigo de revisão de literatura que tem como objetivo apresentar um estudo sobre as pesquisas já realizadas que estão relacionadas para conhecer um pouco mais sobre essa temática e descobrir o que está sendo desenvolvido para aprofundamento de conhecimento desses estudos. Este tipo de metodologia foi escolhido por possibilitar uma análise criteriosa e detalhada acerca das produções científicas existentes sobre o tema: Intervenção Precoce de Crianças com Transtorno do Espectro Autista na Educação Infantil.
Os achados revelados nos permitem compor um cenário que apresenta como a intervenção precoce de crianças com TEA no espaço escolar vem sendo discutida na produção acadêmica, sendo a nossa intenção principal a de situar a discussão em torno das mesmas. As primeiras impressões nos levaram a perceber que esta tem sido uma temática pouco discutida. Para direcionar nossa criterioso buscando palavras-chave “intervenção precoce, autismo e educação infantil”, o período de busca da pesquisa foi de estudos publicados entre 2018 a 2023, onde foi selecionado um total de 15 pesquisas referentes ao tema em estudo, sendo 5 nos artigos e periódicos e nos trabalhos publicados nas entidades científicas, 5 dissertações de mestrado que abordam a temática e 5 trabalhos completos que tratam a intervenção precoce e TEA como tema principal e observamos que cada trabalho aborda a temática com um olhar criterioso buscando mostrar as inúmeras possibilidades de investigação sobre essa área de ensino.Organizamos os resultados encontrados neste artigo começando por uma explanação mais ampla sobre a temática. A opção por partir de um panorama geral se justifica pelo número relativamente pequeno de textos que tratam como tema central. Assim, consideramos ser necessário analisar mais especificamente de que falam, com maior recorrência, os textos que abordam a intervenção precoce, para depois focalizar as ênfases e lacunas concernentes aos estudos sobre crianças com TEA na educação infantil.
Para melhor fluência na organização do texto, e para facilitar a leitura, apresentamos num primeiro momento, a construção do conhecimento das temáticas das três fontes consultadas sob o tema mais amplo – Intervenção precoce; num segundo momento, com o intuito de abordar considerações pertinentes a respeito da temática, apresentaremos as perspectivas teóricas e metodológicas enfatizando os primeiros estudos, locais onde o tema é mais pesquisado e os subtemas associados. Num terceiro momento, destacaremos os mesmos aspectos acima citados, porém, enfocando as considerações que os textos nos permitiram detectar sobre a temática.
Nossa expectativa é a de que essas análises contribuam para que pesquisadores que se interessam pela temática intervenção precoce de crianças com TEA na educação infantil atentem para questões que há muito têm sido almejada e até hoje deixadas à mercê da boa vontade, mas que continuam interferindo diretamente no modo como os sujeitos são tratados no ambiente escolar e posteriormente influenciando na sua vida acadêmica.
Almejamos também que esta temática venha a subsistir nas pesquisas acadêmicas brasileiras com maior ímpeto para que verdadeiramente mais pessoas tenham acesso ao conhecimento dessa temática de grande relevância para a educação como um todo.
- CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO
A intervenção precoce voltada a crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) constitui-se como uma estratégia fundamental para potencializar o desenvolvimento global, promover a autonomia e favorecer a inclusão escolar e social, proporcionando meios eficazes para uma aprendizagem acessível em todos os aspectos cognitivo, social e pessoal.
No contexto da educação infantil, a intervenção precoce assume um papel essencial, pois a escola é, muitas vezes, o primeiro espaço social estruturado em que a criança com TEA interage de forma contínua, permitindo a observação de comportamentos, a identificação de necessidades específicas e a implementação de práticas pedagógicas individualizadas. Além de atender aos aspectos educacionais, a intervenção precoce nesse ambiente deve articular-se ao trabalho de equipes multiprofissionais, integrando ações da educação, saúde e assistência social, a fim de garantir uma abordagem ampla e humanizada. Dessa forma, compreender a relevância e os métodos da intervenção precoce na educação infantil é imprescindível para o desenvolvimento de políticas públicas, a capacitação docente e a efetiva promoção de uma educação inclusiva.
Considerando a constante produção acadêmica brasileira, sobretudo nos primeiros anos do século XXI e o representativo volume de trabalhos publicados, sejam teses, dissertações, artigos, no bojo da temática intervenção precoce e autismo, julgamos necessário eleger alguns conhecimentos a respeito do tema e elencar, no que concerne à seleção das fontes utilizadas para o levantamento dos dados que compõem esta revisão para melhor situar o leitor e disponibilizar informações que o situe no tema.
Referente aos artigos de periódicos e revistas da biblioteca eletrônica SCIELO, utilizamos como critério de seleção apenas aquelas mais específicas sobre a temática; usamos como busca as seguintes conjugações de palavras: ‘intervenção precoce’, autismo e educação infantil’.
Os artigos foram tabelados por ordem cronológica de publicação, a fim de demonstrar quais artigos foram analisados. Foi evidenciado o nome do artigo, local e ano, subtemas, teorias, tipo de pesquisa, resultados e lacunas. A partir daí, obtivemos os seguintes dados apresentados no quadro 1:
Quadro 1- ARTIGOS DA BASE SCIELO
Fonte: elaborado pelas autoras, 2025
Atinente às dissertações publicadas na biblioteca digital do IBICT, utilizamos como critérios àquelas que nos remetessem a programas de pós-graduação avaliados pela CAPES. Neste caso, usamos como palavras-chave ‘intervenção precoce’ e ‘autismo e educação infantil’. Selecionamos o seguinte número de dissertações:
Quadro 2 – DISSERTAÇÕES DO BANCO DE DADOS IBICIT
Fonte: elaborado pelas autoras, 2025.
Quanto aos trabalhos completos, a busca foi realizada na Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) através das palavras-chave “intervenção precoce e autismo” no GT 15 e nas reuniões anuais da ANPEd dos anos 2015, 2017 e 2023 e no XV encontro de pesquisa educacional do Nordeste, no ano de 2020. Observemos o quadro abaixo.
Quadro 3 – Trabalhos completos do GT-15 da ANPED e XV EPEN
Fonte: elaborado pelas autoras, 2025.
2.1 Primeiros estudos, locais onde o tema é mais pesquisado e os subtemas associados
A intervenção precoce tem como objetivo identificar e abordar as necessidades específicas da criança, os primeiros estudos sobre intervenção precoce no transtorno do espectro autista (TEA) foram realizados por Dawson et al. (2010), e se tratando sobe o intervir, a palavra intervir deriva do Latim INTERVENIRE, que significa interceder, mediar. A palavra precoce, também de origem latina, significa prematuro ou antes do tempo. Assim, intervir precocemente significa interferir antes do tempo ou interceder prematuramente (Lourenço, 2018).
Rogers e Vismara (2008) destacam a importância de intervenções precoces, ressaltando que essas estratégias têm o potencial de modificar a trajetória do desenvolvimento das crianças com TEA.
Nesse viés das pesquisas selecionadas, conforme os dados disponibilizados no Quadro 1, é possível constatar que a produção de pesquisas voltadas para a temática Intervenção Precoce de crianças com transtorno do espectro autista (TEA) na Educação Infantil, buscada nas bases de dados indicadas, não aumentou tanto nos últimos 5 anos, mantendo um número similar de publicações entre os anos de 2018 a 2023. Isso implica na escassez de publicações para subsidiar essa tão falada importância no ato de intervir desde a educação infantil, sobretudo em crianças com autismo.
A partir do Quadro 2, é também possível concluir que das 5 dissertações analisadas, a maior concentração de dissertações é na região Sul e Sudeste, nos programas de pós-graduação da UFSM, com 1 dissertação, na UNIFESP, com 2 dissertações e na UFSCAR, com 1 dissertação e 1 dissertação na UNICENTRO, representando a região centro oeste. Os programas de pós-graduação em que essas pesquisas são mais frequentes são os de Educação e Saúde.
Os artigos de revistas e periódicos, no que ressoa às temáticas, em sua maioria, ecoam subtemas ligados ao autismo na educação infantil, os artigos enfocam a intervenção precoce, relacionando com a educação de crianças. Os textos voltam suas análises para a importância e o cuidado de fazer a observação do comportamento da criança na escola, pois afirmam que é lá que são observados todos os aspectos voltados ao desenvolvimento infantil.
A ANPED por ser uma associação específica da área da educação, contribui para que educadores pesquisadores busquem sempre por suas pesquisas publicadas, neste caso, lemos os resumos dos trabalhos e selecionamos aqueles que abordam a temática intervenção precoce na educação infantil no ambito do autismo no contexto escolar e que fazem relação com crianças pequenas.
Como visto no Quadro 3, foram selecionados 5 trabalhos completos. No XV EPEN, selecionamos 1 trabalho e mais 4 trabalhos completos publicados nos anais, considerando que todos tratam da temática intervenção precoce, autismo e educação infantil. Assim, temos o total de 5 trabalhos selecionados para análise preliminar.
Os destaques encontrados nos indicam que os trabalhos completos que abordam a temática no espaço escolar o fazem relacionando esta temática com o subtema autismo na infância. Do total de trabalhos completos analisados, todos analisam a sua eficácia na escola relacionada com a intervenção na educação infantil.
Dentre todos os textos analisados, entre dissertações, artigos e trabalhos completos, a associação entre o tema intervenção precoce e autismo na educação infantil, está presente na maioria dos textos. Sendo assim, quase todos os textos identificados fazem a relação de intervenção e educação infantil’, sendo esses conceitos tidos como praticamente indissociáveis. Em geral, os textos introduzem o assunto falando sobre intervenção precoce no âmbito maior para, em seguida, focalizar na questão educação infantil e posteriormente, abordam as subtemáticas específicas no autismo.
2.2 Principais teorias, metodologias, resultados e lacunas
O termo “intervenção precoce” é mencionado no Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Brasil, 2011), sendo referido a intervir precocemente para identificação de deficiências através de exames, com enfoque na importância da triagem neonatal.
Citado também na Lei Brasileira de Inclusão, (Brasil, 2015), sendo utilizado com relação ao direito que as pessoas com deficiência, de forma geral, possuem em receber a intervenção, com enfoque em ações de habilitação ou reabilitação (Vida, 2020).
Os resultados também sugeriram que intervenções precoces não apenas oferecem benefícios imediatos, mas proporcionam impactos a longo prazo. Crianças que receberam intervenções intensivas exibiram melhorias duradouras em várias áreas, incluindo autonomia, habilidades de vida diária e participação social. Evidências longitudinais reforçaram a ideia de que intervenções precoces podem moldar positivamente a trajetória do desenvolvimento e reduzir os desafios comportamentais ao longo do tempo.
Por sua vez o transtorno do espectro autista ainda se apresenta como um processo de conhecimento que necessita de bastante estudo. As revelações dos avanços na compreensão do TEA, os quais contribuem para que a intervenção precoce contribua na detecção dos primeiros sinais e sintomas que podem surgir desde a mais tenra idade, ainda necessita de maiores esclarecimentos e compreensão.
Verificou-se ainda, que o diagnóstico do TEA é enigmático, ou seja, não há exames exatos que são capazes de detectá-los, o diagnóstico é feito através da observação clínica. Legalmente no Brasil é o médico neurologista ou psiquiatra que faz o diagnóstico baseando-se em relatórios e discussões com equipe interdisciplinar. O aprofundamento em leituras e pesquisas tem possibilitado o entendimento de que o transtorno possui uma gradação e de que cada criança manifesta alguns sinais e outras não. Cada uma é singular, tem a sua própria forma de ver e entender o mundo. De acordo com o DSM-V o Transtorno do Espectro Autista é um transtorno do neurodesenvolvimento, e tem como principais características os déficits na comunicação e na interação social, padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses em atividades, com início dos sintomas na primeira infância.
Contudo, o termo Espectro do Autismo, que substitui os Transtornos Globais do Desenvolvimento, é utilizado devido à heterogeneidade das manifestações do transtorno, as quais variam muito quanto à sua severidade. Por exemplo, na área social, as dificuldades podem ocorrer desde resistência em iniciar interações sociais até aversão ao contato com os demais. Nesse sentido, é a escola que pode propiciar a essas crianças oportunidades de convivência com outras da mesma faixa etária, podendo constituir-se como um importante espaço de desenvolvimento e aprendizagem (Camargo, Bosa, 2009).
Apesar da escassez de publicações, pode-se afirmar que a escola deve acolher a criança com Necessidades Educacionais Especiais (NEE) e assim “[...] devem ser abertas janelas de oportunidades para que as crianças aprendam determinados tipos de aprendizagem, que se não forem adquiridas neste período crítico se tornam difíceis, quando não impossíveis, de serem adquiridas mais tarde.” (Mendes, 2010, p. 48). Sabe-se que quanto mais precoce o diagnóstico, mais fácil é o processo de adaptação e aprendizagem.
Quanto as intervenções intensivas e personalizadas, como a Análise do Comportamento Aplicada (ABA), antes dos três anos de idade, elas podem resultar em melhorias significativas em habilidades sociais, de comunicação e comportamentos adaptativos (Dawson et al., 2010). Pois é nesse período que as crianças estão aptas para as aprendizagens.
Ainda segundo o texto, pesquisadores estão constantemente em busca de melhores condições para oferecer para suas pesquisas, e em se tratando do TEA é válido ressaltar que as leis também são necessárias para dar sustentabilidade e garantir direitos. Em 2012 foi aprovada a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA), também conhecida como Lei Berenice Piana, teve um impacto significativo no reconhecimento e na garantia dos direitos das pessoas com TEA no Brasil. Essa legislação representa um avanço importante na luta pela inclusão e igualdade de tratamento para indivíduos dentro do espectro autista, fornecendo diretrizes claras e abrangentes para a promoção de seus direitos fundamentais, como saúde, educação, trabalho e acesso à justiça (Molina, 2021). Sendo assim, os autistas são amparados por lei e assim podem exigir seus direitos.
A partir dessa lei, o Estado brasileiro passou a se responsabilizar por oferecer assistência integral e multidisciplinar às pessoas com TEA, a fim de proporcionar uma vida digna e o desenvolvimento de suas potencialidades. Além disso, a Lei Berenice Piana busca garantir a participação e a acessibilidade dessas pessoas em todas as esferas da sociedade, promovendo a inclusão social e combatendo a discriminação e o preconceito. Apesar dos avanços conquistados, ainda há desafios a serem enfrentados, como a implementação efetiva das políticas previstas na lei, a conscientização e a capacitação de profissionais que lidam com pessoas com TEA e a ampliação de recursos destinados a essa população (Lima, 2023).
Embora essas intervenções precoces tenham demonstrado resultados positivos, mesmo sendo amparadas por leis, Smith (1999) ressalta que a eficácia está intrinsecamente ligada à individualização do tratamento. Cada criança no espectro do autismo possui necessidades únicas, demandando estratégias terapêuticas adaptadas e personalizadas, com isso as dificuldades podem ser minimizadas se forem detectadas precocemente e, assim que forem descobertas, se iniciem as intervenções.
Para Cosenza e Guerra (2011, p. 135), o diagnóstico e intervenção precoce indicam uma estratégia efetiva em muitas crianças, possibilitando a uma qualidade de vida. Os autores afirmam que “as intervenções educacionais, comportamentais e fonoaudiológicas são as mais importantes e visam o desenvolvimento social e cognitivo, as comunicações verbal e não verbal, a capacidade de adaptação e a solução de comportamentos indesejáveis”.
É importante saber que, a presença da criança dentro da instituição de educação infantil por si só não garante o seu desenvolvimento. É necessário que o foco do professor esteja na criança concreta que está dentro da instituição, uma criança que tem conhecimento acumulado, que tem seus interesses e suas necessidades. Embora as aproximações entre Educação Especial e Educação Infantil já sejam possíveis na política educacional brasileira, é preciso avançar na produção de conhecimentos que apontem caminhos para a construção de práticas pedagógicas inclusivas, que atendam a estratégia do Plano Nacional de Educação, com o intuito dede ofertar o atendimento escolar a crianças de zero a três anos com deficiência, público alvo da educação especial (Vitta et al., 2016; Brasil, 2014a).
Não há como quantificar as consequências da deficiência na vida da criança, sobretudo, os comprometimentos intelectuais. Mas percebemos uma necessidade de suprir essas demandas antes mesmo de ter certeza da deficiência e das proporções desse possível comprometimento. A forma que o aluno é encarado pelo professor influência nas atividades propostas, assim, o professor precisa romper a prática de ensino mecanizada, apostilada, pensada no vestibular, para uma compreensão mais ampla, entendendo que o processo de ensino-aprendizagem deve contemplar as relações entre mediação pedagógica, cotidiano e formação de conceitos. A inclusão escolar favorece a vida em sociedade, além de proporcionar um espaço para que crianças possam se relacionar com outras (Bertoldi & Brzozowski, 2020).
Os professores apontam dificuldades com relação ao desconhecimento das limitações de crianças com atrasos no desenvolvimento, à falta de rede de apoio/parceria com outros profissionais, ao excesso de alunos em sala e ao sentimento de não realização profissional, o que vem acarretando reservas quanto à inclusão de crianças que apresentam atrasos no desenvolvimento (Ambrosio, 2012). O impacto nas famílias foi outro achado significativo. As intervenções precoces forneceram suporte crucial às famílias, reduzindo o estresse e promovendo uma melhor qualidade de vida. No entanto, observou-se a necessidade de maior envolvimento e orientação aos pais e cuidadores durante e após o processo terapêutico. Além disso, há um consenso de que as famílias que convivem com o TEA demandam intervenções que, além dos benefícios para seus filhos, considerem a manutenção e fortalecimento familiar (Oliveira et al., 2020). Quando os pais descobrem o diagnóstico, muitos passam por uma espécie de luto, apresentando decepção por meio de choro ou, até mesmo de negação, tendo em vista a imagem formada pelo filho idealizado.
Silva (2015) sugere que o diagnóstico e a intervenção precoces aumentam as chances de as crianças frequentarem a educação regular, obterem sucesso educacional e o ajustamento social. Além de aliviar o sofrimento das famílias e das crianças, o que demonstra a importância dos instrumentos de triagem efetivos, objetivos e de baixo custo. É importante ponderar que, por mais que existam instrumentos para dar suporte ao professor, precisa-se ter cuidado no dimensionamento dessa ação, pois estes não podem se sobrepor ao acompanhamento responsável do desenvolvimento infantil, considerando, com flexibilidade, a manifestação das habilidades por faixa etária.
É importante destacar também a relevância da saúde de pessoas com autismo e para garantir inclusão é fundamental que elas tenham acesso a serviços de saúde adequados e de qualidade. Isso inclui desde o diagnóstico precoce e o tratamento especializado até a promoção de ações que visem à melhoria da qualidade de vida dessas pessoas e suas famílias (Santos, 2017).
Dentre os principais benefícios da intervenção precoce juntamente aos cuidados com profissionais da saúde, destacam-se o aumento da capacidade de aprendizagem e o desenvolvimento das funções cognitivas, competências linguísticas, redução da gravidade dos sintomas do autismo, melhor resposta a adaptação e socialização. A remissão de sintomas ocorre com a evolução cognitiva da criança, ainda que o autismo não tenha cura, mas tem tratamento.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
De modo geral, a análise dos estudos selecionados nesta revisão proporcionou um resgate de fontes importantes de conhecimento sobre a intervenção precoce de crianças com TEA na educação infantil, além de apresentar um esboço sobre alguns dos principais temas que estão sendo investigados. Entretanto, ressalta-se que ainda são poucas as pesquisas nessa área, principalmente em âmbito nacional, por isso, apontam-se a necessidade de novos estudos brasileiros apresentarem reflexões e questionamentos sobre a temática em questão.
A análise dos trabalhos encontrados fornece a possibilidade de um panorama sistematizado produzidos nos últimos 5 anos no Brasil, contribuindo para o avanço de política públicas e pesquisas em primeira infância e autismo na educação infantil com a articulação e contribuição da aplicação das práticas centradas na família dentro do atendimento em intervenção precoce na infância.
Neste estudo podemos concluir que a intervenção em qualquer idade traz benefícios, entretanto, a intervenção precoce se mostra ainda mais importante, sendo essencial para as crianças com transtorno do espectro autista para que o desenvolvimento ocorra de maneira positiva, suavizando os impactos sintomatológicos manifestos futuros.
É observável com este estudo que as práticas voltadas às crianças com alteração de desenvolvimento aparecem mais relacionadas com o modelo reabilitativo e clínico de intervenção, em que os aspectos dos componentes de desenvolvimento são voltados para ações à criança. Para que o professor faça a diferença na vida das crianças é importante a oferta de formação continuada, o apoio da família; a troca de experiências com os colegas de profissão e outros profissionais que atendam ou possam vir a atender essas crianças, para juntos realizarem um trabalho colaborativo de qualidade e eficácia.
Os achados mostram que estamos com práticas muito distantes dos princípios de intersetorialidade e do aumento de competências das famílias para lidar com as questões do desenvolvimento das crianças, com foco nas rotinas e nas aprendizagens em contextos naturais como já utilizado internacionalmente. Tendo a necessidade de trazer mais contribuições científicas e práticas para mudança de paradigma das práticas de Intervenção Precoce na Infância, a fim de promover o avanço dos estudos acerca da eficácia dos programas e que os estudos fundamentam melhores práticas em desenvolvimento infantil em nosso país.
As intervenções precoces propiciam benefícios clínicos e educacionais, a cada intervenção deve-se estimular uma determinada área afetada pelo TEA, aumentando essa estimulação do decorrer do progresso da criança em cada habilidade, sendo muito importante para obter resultados significativos o tempo, a frequência e a intensidade das intervenções. a equipe multiprofissional deve promover ações voltadas para a orientação dos pais/ cuidadores quanto ao autismo, sinais de alerta da patologia, e as medidas necessárias de cuidado para crianças com TEA, sendo importante informar os pais desde a primeira consulta de puericultura quanto aos sinais que a criança pode apresentar assim como estratégias de estimulação precoce no desenvolvimento da mesma.
Ainda existe uma carência por parte tanto dos pais e dos profissionais sobre o autismo, o que dificulta no estabelecimento de estratégias de enfrentamento pela família e ao se deparar com o diagnóstico do TEA. Por isso há necessidade de produções científicas acerca da temática além de capacitação dos profissionais nos demais níveis de assistência à saúde e educação, bem como da equipe multiprofissional, para melhor direcionar os pais e atuar em conjunto promovendo o desenvolvimento saudável das crianças.
O estudo teve como limitação na busca de artigos voltados para intervenção precoce aliada a tecnologia, e da atuação da equipe multiprofissional juntamente com os pais na aplicação das intervenções, além de mais detalhamento acerca de como deve ocorrer as intervenções precoce e como atuar na inclusão dos mesmos, não foram encontrados estudos sobre a temática produzidos no Brasil que realmente esclareça todos os pontos necessários.
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[1] Mestranda em Educação. Pedagoga. E-mail: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.
[2] Doutora em Educação. Pedagoga. E-mail: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo..